Reprimir o Desejo Sexual faz Mal?
Postado por Augustus Nicodemus Lopes
Sempre recebo comentários de alguns leitores de
que a abstinência sexual defendida por mim e outros escritores e pastores
provoca nos jovens evangélicos traumas e neuroses. Ou seja, passar a
adolescência e a mocidade sem ter relações sexuais faz com que os evangélicos
fiquem traumatizados, perturbados mental e espiritualmente, reprimidos e
recalcados.
Esse raciocínio tem sua origem mais recente nas idéias do famoso Sigmund Freud.
Para ele, o sexo era o fator dominante na etiologia das neuroses e o desejo
sexual era a motivação quase que exclusiva para o comportamento das pessoas. No
início, Freud falava que o ser humano, até biologicamente (todos os seres
vivos, no final), viveria sua existência na tensão entre dois princípios, ou
instintos, primordiais: o princípio do prazer (instintivo e ligado ao id,
às vezes relacionado como a libido) e o princípio da realidade (a limitação do
prazer para tornar a vida possível, princípio ligado mais ao amadurecimento e,
às vezes, ao superego). Mais tarde (na publicação de Além do Princípio do
Prazer, 1920), ele passou a falar em outros dois princípios mais amplos, o
princípio de vida e o princípio de morte, os quais ele denominou eros e tanatos,
como os dois princípios que geram a tensão que move o ego. De qualquer modo,
tanto o princípio do prazer quanto eros (princípio de vida) eram, para Freud,
princípios instintivos, ligados à preservação da vida e da espécie, e sempre
conectados ao apetite sexual (ver Os Instintos e Suas Vicissitudes,
1915).
Nem as crianças estariam livres desse apetite sexual instintivo – elas desejavam
sexualmente seus pais. Freud apelou aqui para o complexo de Édipo, em que o
filho deseja sexualmente a mãe e o complexo de Eletra, a inveja que a menina
tem do pênis do menino. Naturalmente, quando esses desejos sexuais eram
interrompidos, resistidos, negados, o resultado eram as neuroses, os traumas.
As obras mais conhecidas onde ele sustenta seus argumentos são Sobre as
Teorias Sexuais das Crianças (1908) e Uma criança é espancada - uma
contribuição ao estudo da origem das perversões sexuais (1919), onde ele
defende o surgimento das neuroses como resultado da repressão do desejo sexual.
Em que pese a importância de Freud, seu modelo e suas idéias têm sido
largamente criticados e rejeitados por muitos estudiosos competentes. Todavia,
algumas de suas idéias – como essa de que a repressão sexual é a causa de todas
as neuroses e distúrbios – acabou se popularizando e é repetida por muitos que
nunca realmente se preocuparam em examinar o assunto mais de perto.
Vou dizer por que considero esse argumento apenas como mais uma desculpa dos
que procuram se justificar diante de Deus, da igreja e de si mesmos pelo fato
de terem relações sexuais antes e fora do casamento. Ou pelo menos, por
defenderem essa idéia.
1. Esse argumento parte do princípio que os evangélicos conservadores são
contra o sexo. Contudo, essa idéia é uma representação falsa da visão cristã
conservadora sobre o assunto. Nós não somos contra o sexo em si. Somos contra o
sexo fora do casamento, pois entendemos que as relações sexuais devem ser desfrutadas
somente por pessoas legitimamente casadas (ah, sim, cremos no casamento
também). Foi o próprio Deus que nos criou sexuados. E ele criou o sexo não
somente para a procriação, mas como meio de comunhão, comunicação e prazer
entre marido e mulher. Há muitas passagens na Bíblia que se referem às relações
sexuais entre marido e mulher como sendo fonte de prazer e alegria. O livro de
Cantares trata abertamente desse ponto. Em Provérbios encontramos passagens
como essa:
Seja bendito o teu manancial, e alegra-te com a mulher da tua mocidade,
corça de amores e gazela graciosa. Saciem-te os seus seios em todo o tempo; e
embriaga-te sempre com as suas carícias (Pv 5.18-19).
Não, não acredito que o sexo é somente para a procriação. Não, não sou contra
planejamento familiar e o uso de meios preventivos da gravidez, desde que não
sejam abortivos. Sim, o sexo é uma bênção, desde que usado dentro dos limites
colocados pelo Criador.
2. Esse argumento, no fundo, acaba colocando a culpa em Deus, na Bíblia e na
Igreja de serem uma fábrica de neuróticos reprimidos. Sim, pois a Bíblia ensina
claramente a abstinência, a pureza sexual e a virgindade para os que não são
casados, conforme argumentei no post Carta a Um Jovem Evangélico que Faz Sexo com a
Namorada. Se a abstinência sexual antes do casamento traz
transtornos mentais e emocionais, então, de acordo com os libertinos,
deveríamos considerar esses ensinamentos da Bíblia como radicais, antiquados e
inadequados. E, portanto, como meras idéias humanas de pessoas que viveram numa
época pré-Freud – e como tais, devem ser rejeitadas e descartadas como palavra
de homem e não Palavra de Deus. Ao fim, a contenção dos libertinos é mesmo
contra a Bíblia e contra Deus.
3. Bom, para esse argumento ser verdadeiro, teríamos de verificá-lo
estatisticamente, na prática. Pesquisa alguma vai mostrar que existe uma
relação direta de causa e efeito entre abstinência antes do casamento e
distúrbios mentais, neuroses e coisas afins. Da mesma forma que pesquisa alguma
vai mostrar que os jovens que praticam sexo livre antes do casamento são
equilibrados, sensatos, sábios e inteligentes. Pode ser que até se prove o
contrário. Os tarados, estupradores e maníacos sexuais não serão encontrados no
grupo dos virgens e abstinentes.Talvez fosse interessante mencionar nesse
contexto o estudo conduzido na Universidade de
Minessota por Ann Meir. De acordo com as pesquisas, o sexo estava associado a
auto-estima baixa e depressão em garotas que iniciaram as relações sexuais
(idade média de início 15-17 anos) sem relacionamento afetivo ou romântico.
4. A coisa toda é muito estranha. Funciona mais ou menos assim. Os libertinos
tendem a considerar todo distúrbio que encontram como resultado de repressão
dos desejos sexuais. Mas eles fazem isso não porque têm estatísticas,
experiências ou históricos que provam tal teoria – mas porque Freud explica. Em
vez de considerarem que esses distúrbios podem ter outras causas, seguem sem
questionar a tese de Freud que tudo é sexo, desde o menininho de um ano chupando
dedo até o complexo de Édipo.
O próprio Freud, na fase mais amadurecida de sua carreira, se questiona na obra
Além do Princípio do Prazer (1920):
A essência de nossa investigação até agora foi o traçado de uma distinção
nítida entre os “instintos do ego” e os instintos sexuais, e a visão de que os
primeiros exercem pressão no sentido da morte e os últimos no sentido de um
prolongamento da vida. Contudo, essa conclusão está fadada a ser insatisfatória
sob muitos aspectos, mesmo para nós.
5. Embora a decisão de preservar-se para o casamento vá provocar lutas e
conflitos internos no coração e mente dos jovens evangélicos, esses conflitos
nada mais são que a luta normal que todo cristão verdadeiro enfrenta para viver
uma vida reta e santa diante de Deus, mortificando o pecado e se revestindo
diariamente de Cristo (Romanos 3; Colossenses 3; Efésios 4—5). Fugir das
paixões da mocidade foi o mandamento de Paulo ao jovem Timóteo (2Timóteo 2:22).
Essa luta contra a nossa natureza carnal não provoca traumas, neuroses,
recalques e distúrbios. Ao contrário, nos ensina paciência, perseverança, a
amar a pureza, a apreciar as virtudes e o que significa tomar diariamente a
cruz, como Jesus nos mandou (Lucas 9:23). Os que não querem tomar o caminho da
cruz, entram pela porta larga e vivem para satisfazer seus desejos e instintos.
Por esses motivos acima e por outros que poderiam ser acrescentados considero
esse argumento – de que a abstenção das relações sexuais antes do casamento
provoca complexos, neuroses, recalques – como nada mais que uma desculpa para
aqueles que querem viver na fornicação. Não existe realmente substância e
fundamento para essa idéia, a não ser o desejo de justificar-se ou desculpar-se
diante de uma consciência culpada, da opinião contrária de outros ou dos
ensinamentos da Escritura.
Os interessados em estudar mais esse assunto poderão aproveitar bastante o
livro Sexo Não é problema – Lascívia, Sim – de Joshua Harris, pela
Editora Cultura Cristã
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Rô Santana